Autismo: Diagnóstico precoce pode ser fundamental

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“A Débora não mamou, era inquieta, não aceitou as primeiras papinhas, não sentou e também não engatinhou no tempo devido. Girava muito tampas de panelas e rodas”. Foi a partir dessas características que a mãe da pequena Débora Gabriele Costa Carvalho, de 8 anos, viu acender o sinal de alerta. Junto com uma equipe multidisciplinar recebeu o diagnóstico de que a filha pertence ao universo de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Em Marabá, além de Débora, de acordo com o Censo Escolar de 2020, mais 159 alunos estão matriculados na rede pública municipal com autismo. Esse número não inclui múltiplas deficiências.

Essas crianças recebem atendimento especializado, o AEE (Atendimento Educacional Especializado) em 36 salas de recursos que o município dispõe, situadas nas próprias escolas municipais.

A coordenadora do Departamento de Educação Especial da Semed (Secretaria Municipal de Educação), Arley Novais de Oliveira, explica que os alunos na maioria, quando autistas, são matriculados na escola, com laudo, e encaminhados para as salas de recursos.

Aluno sem laudo é avaliado pelo comportamento ou características

“Aquele que ainda não tem laudo ou que o pai não percebeu, pelas características do aluno, pelo comportamento, que se trata de aluno autista, é encaminhado ao departamento, para que seja feita a triagem dele e avaliação com equipe multidisciplinar. Essa avaliação vai detectar se ele é de fato público-alvo da educação especial. No no caso de suspeita de autismo, o aluno é encaminhado para o serviço de saúde e para o atendimento na sala multifuncional”, a coordenadora.

Na sala de recursos, esse aluno é atendido por dois professores especializados, duas vezes na semana. O atendimento dura entre uma e duas horas. Esse professor da sala de recursos vai até a escola regular, a fim de passar orientações ao professor da sala comum.

“As orientações são em relação à adaptação de material, informações ao professor do ensino comum, sobre quais as potencialidades e dificuldades desses alunos”, destaca a coordenadora da Educação Especial.

Rede pública dispõe de profissionais de apoio

Hoje, a rede pública dispõe de alguns profissionais de apoio que atuam com o público de alunos autistas. Desde 2020 foi implementado o profissional de apoio mediador. Esse professor de nível superior é pedagogo, com especialização em Educação Especial, que atua com alunos autistas na mediação. Ele faz acompanhamento, planejamento e produção de material também, tudo em conjunto com o professor de ensino comum e da sala de recursos nas necessidades que o aluno requer.

A pedagoga Roberta Araújo Barbosa atua na área da Educação Especial há oito anos, ela trabalha em uma sala de recursos na Escola Municipal Ida Valmont, localizada no Bairro Novo Horizonte.

Roberta ficou motivada a entrar nessa área, devido ter iniciado a carreira com contrato na Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais), em 2009, ficando ali até 2011.

Município precisa avançar em políticas públicas

Em 2014, ao ser aprovada em concurso, continuou na educação especial, porque se identificou com o segmento. “Na verdade, trabalhar com crianças que não exprimem a linguagem não verbal, com autistas e alfabetizar é emocionante”, relata ela.

Questionada sobre em que o município precisa avançar, Roberta respondeu que em políticas públicas, para assegurar o mediador aos estudantes no ensino comum, na adaptação e na qualidade de material pedagógico. Atualmente, ela atende a 29 alunos com autismo. Durante a pandemia os trabalhos são conduzidos com cadernos de atividades adaptadas, que são entregues a cada 15 dias, além de elaboração de plano de ensino individualizado e planejamento.

Primeiros sinais de autismo

A pedagoga Laucilene Costa Carvalho da Silva é mãe da pequena Débora Gabriele Costa Carvalho da Silva, citada no início da matéria. Antes ela genitora não possuía uma leitura aprofundada acerca do autismo. Os primeiros sinais de TEA da filha foram detectados pelo marido, que era leitor de uma revista científica e logo associou as características de Débora.

Desde cedo, a menina apresentou algumas diferenças, como por exemplo, não mamar, e, ainda, comportamento inquieto. Ao ser alimentada com as primeiras papinhas e sucos, ela também não aceitou. “Ela não dava tchau e chorava muito. Aos 6 meses não sentou e não engatinhou. A partir de um ano percebemos mais diferenças ainda, quando ela começou a brincar. Girava muito tampas de panelas e rodas. Só veio andar com um ano e seis meses, sempre apresentando atraso. Falou a palavra mãe com 9 meses e ainda palavras soltas”, frisa Laucilene.

Outro ponto mais gritante, que chamou atenção dos pais de Débora, foi em relação à restrição alimentar. Ela não come comida, aceita apenas mingau. Por isso, Laucilene tenta complementar a alimentação da filha com verduras como inhame, macaxeira, batata doce etc.

A partir daí, Débora foi levada ao pediatra que, com ajuda de outros profissionais, como fonoaudiólogo, neuropediatra, psicólogo e terapeuta ocupacional chegaram ao diagnóstico de TEA.

O autista pode ter diversas habilidades 

Débora possui facilidade de aprendizagem e comunicação. Seu hiperfoco é o desenho de animais. Ela tem uma boa memória e desenha com maestria animais e seus detalhes. “A Débora gosta muito de brincar no celular com jogos e se identifica em fazer vídeos. Gosta de fazer as mesmas coisas todos os dias. Se identifica com animais e gosta de frequentar casas de produtos pets. Não gosta de barulhos, tampouco ser incomodada e não se adapta à mudança de rotina. Começou a estudar um pouco tarde pela seletividade alimentar e imunidade baixa. No entanto, desde um ano e pouco teve educação escolar em casa, sendo ensinada pela mãe. Ela ainda não domina letra cursiva, mas escreve com letra bastão. Ela é bastante curiosa e está se desenvolvendo muito bem”, conclui Laucilene.

Outra habilidade de Débora é falar o nome dos animais em inglês, com boa pronúncia ela adora cantar. Ela é atendida na Apae com psicopedagogos, terapeutas ocupacionais, neuropediatras e também faz tratamento dentário.

Entenda o TEA

A psicóloga Rafaela da Paixão Gurjão pontua que o Transtorno do Espectro Autista é um transtorno do neurodesenvolvimento caracterizado por apresentar déficits persistentes na comunicação e na interação social, com comportamentos restritivos e repetitivos em múltiplos contextos. A última edição do Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais- DSM V (2015) passou a abrigar todas as subcategorias do autismo em único diagnostico: TEA. As pessoas são diagnosticadas em único espectro com diferentes níveis de gravidade.

“Temos três níveis: nível 1 (leve) a criança apresenta menos sintomas graves e necessita de pouco suporte para atividades de vida diária. No nível 2 (moderado) a criança está na faixa intermediaria dos sinais e sintomas e necessita de suporte substancial nas atividades de vida diária e apresentam mais dificuldade com habilidades sociais e em situações sociais, comparando com as que estão no nível 1. Já no nível 3 (grave), a criança precisa de muito apoio, já que é a forma mais grave de TEA. Apresentam dificuldades significativas na comunicação, habilidades sociais, comportamentos restritivos e repetitivos que atrapalham seu funcionamento, independente nas atividades cotidianas”, detalha a psicóloga.

Quando o sinal de alerta dos pais deve acender?

A psicóloga narra que os sinais podem aparecer antes dos 3 anos de idade e os pais precisam estar atentos para que possam informar ao médico pediatra ou neuropediatra para obter um diagnóstico precoce. Os primeiros sinais são: não olhar nos olhos da mãe durante a amamentação, não acompanhar com o olhar, poucas reações emocionais (sorrisos e carinhos dos pais e familiares), não reagem quando é chamado pelo seu nome, não interagem socialmente, ficam mais isolados, atraso na fala e a presença de movimentos repetitivos (ficar se balançando para frente e para trás, girando em torno de si entre outros.

As principais características do autista são atraso na fala, falta de contato visual, não responder quando chamado pelo nome; dificuldade em manter uma conversa; ecolalia (repetição de frases ou palavras); dificuldade em compreender os sentimentos dos outros e expressar os seus; comportamentos repetitivos e restritos”.

Para a psicóloga, a melhor forma de tratamento para o TEA é fazer acompanhamento multidisciplinar. “Não há cura, mas com as terapias a pessoa com TEA pode conseguir autonomia e independência em vários setores da sua vida, possibilitando uma melhor qualidade de vida. Por isso o diagnóstico precoce é tão importante para que as intervenções possam ser realizadas antes da poda neural. A poda neural é m processo que ocorre dentro do cérebro, que resulta na redução do número total de neurônios e sinapses antes dos dois anos de idade”, explicita a profissional.

O profissional psicólogo utiliza a terapia ABA (uma terapia que usa técnicas de ensino baseadas em evidências) no autista. A intervenção é específica e individual dependendo do nível que a criança se encontra e da avaliação inicial. O psicólogo também é importante no apoio familiar desde a entender o diagnóstico, lidar com o luto em vida, das expectativas quanto ao desenvolvimento da criança até envolvê-los no tratamento do filho.

Acerca das dicas para lidar com autistas, a psicóloga respondeu que cada criança é única, entretanto, no ambiente doméstico, os responsáveis/cuidadores devem ter cuidados com os acidentes domésticos, estimular a criança com brincadeiras, além de fazer uma rotina semanal. (Texto: Emilly Coelho)

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